O permanente e o provisório - Por Martha Medeiros
O casamento é permanente, o namoro é provisório.
O amor é permanente, a paixão é provisória.
Uma profissão é permanente, um emprego é provisório.
Um endereço é permanente, uma estada é provisória.
A arte é permanente, a tendência é provisória.
De acordo? Nem eu.
Um casamento que dura 20 anos é provisório. Não somos repetições de nós
mesmos, a cada instante somos surpreendidos por novos pensamentos que
nos chegam através da leitura, do cinema, da meditação. O que eu fui
ontem, anteontem, já é memória. Escada vencida degrau por degrau, mas o
que eu sou neste momento é o que conta, minhas decisões valem pra agora,
hoje é o meu dia, nenhum outro.
Amor permanente… como a
gente se agarra nesta ilusão. Pois se nem o amor pela gente mesmo
resiste tanto tempo sem umas reavaliações. Por isso nos transformamos,
temos sede de aprender, de nos melhorar, de deixar pra trás nossos
imensuráveis erros, nossos achaques, nossos preconceitos, tudo o que
fizemos achando que era certo e hoje condenamos. O amor se infiltra
dentro da nós, mas seguem todos em movimento: você, o amor da sua vida e
o que vocês sentem. Tudo pulsando independentemente, e passíveis de se
desgarrar um do outro.
Um endereço não é pra sempre, uma
profissão pode ser jogada pela janela, a amizade é fortíssima até
encontrar uma desilusão ainda mais forte, a arte passa por ciclos, e se
tudo isso é soberano e tem valor supremo, é porque hoje acreditamos
nisso, hoje somos superiores ao passado e ao futuro, agora é que nossa
crença se estabiliza, a necessidade se manifesta, a vontade se impõe –
até que o tempo vire.
Faço menos planos e cultivo menos
recordações. Não guardo muitos papéis, nem adianto muito o serviço.
Movimento-me num espaço cujo tamanho me serve, alcanço seus limites com
as mãos, é nele que me instalo e vivo com a integridade possível. Canso
menos, me divirto mais, e não perco a fé por constatar o óbvio: tudo é
provisório, inclusive nós.
Martha Medeiros
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